Florestan Fernandes
Florestan Fernandes | |
---|---|
Nascimento | 22 de julho de 1920 São Paulo, SP |
Morte | 10 de agosto de 1995 (75 anos) São Paulo, SP |
Cidadania | Brasil |
Alma mater | Universidade de São Paulo |
Ocupação | antropólogo, escritor, político, sociólogo, professor universitário, escritor de não ficção |
Profissão | sociólogo |
Prêmios | |
Empregador | Universidade de Toronto, Universidade de São Paulo |
Florestan Fernandes (São Paulo, 22 de julho de 1920 – São Paulo, 10 de agosto de 1995) foi um sociólogo e político brasileiro filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT). Patrono da sociologia brasileira sob a lei nº 11 325,[1] também foi deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT), tendo participado da Assembleia Nacional Constituinte.[2][3] Recebeu o Prêmio Jabuti em 1964, pelo livro Corpo e Alma do Brasil[4] e Foi agraciado postumamente em 1996 com o Prêmio Anísio Teixeira.[5][6]
Biografia[editar | editar código-fonte]
Origem e primeiros anos[editar | editar código-fonte]
Segundo seus relatos, Florestan Fernandes teve, ainda criança, o interesse pelos estudos despertado principalmente pela diversidade dos lugares onde passou sua infância.[7] Afilhado de Hermínia Bresser, filha de Carlos Augusto Bresser e Anna Bresser, Florestan reconhecia a importância da madrinha na ajuda para estudar:
"O fato é que embora eu não estudasse organizadamente, pelo fato de ter nascido na casa de dona Hermínia Bresser de Lima aprendi o que era livro, a importância de estudar e com pouco mais de seis anos adquiri uma disciplina".[8][9][10]
Filho de mãe solteira, não conheceu o pai.[11] O avô materno trabalhou como colono numa fazenda no interior de São Paulo, tendo morrido por tuberculose, e a mãe, após se mudar para a capital paulista, trabalhou como empregada doméstica.[12] Ganhou o nome do motorista alemão de sua madrinha, amiga de sua mãe.[13] Começou a trabalhar, como auxiliar numa barbearia aos seis anos de idade.[14] Também foi engraxate.[14] Viveu entre a "grande casa" de Dona Hermínia e cortiços, em diversos pontos da cidade.[15][16]
Estudou até o terceiro ano do primeiro grau. Só mais tarde, voltaria a estudar, fazendo curso de madureza, estimulado por frequentadores do Bar Bidu, no centro de São Paulo, onde trabalhava como garçom.[17][18][19]
Em seus relatos, Florestan contou as dificuldades vivenciadas pelas pessoas que considerava lumpen-proletários para conseguir até os mais simples empregos, grupo no qual se identificava:
"Os preconceitos contra esse tipo gente atingiam tais proporções que, nem com o apoio de Clara Augusta Bresser, irmã de minha madrinha, jamais logrei outra espécie de emprego. O mínimo que se pensava, sobre aquele tipo de gente, é que éramos ladrões ou imprestáveis!...".[20]
Formação[editar | editar código-fonte]
No ano de 1941, Florestan ingressou na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCL), instituto vinculado a Universidade de São Paulo (USP), formando-se no curso de Ciências sociais.[21]
Iniciou sua carreira docente em 1945, como assistente do professor Fernando de Azevedo, na cadeira de Sociologia II.[22] Na Escola Livre de Sociologia e Política, obteve o seu título de mestre com a dissertação "A organização social dos Tupinambá".[23] No ano de 1951 defendeu, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, a tese de doutoramento "A função social da guerra na sociedade tupinambá", posteriormente consagrado como clássico da etnologia brasileira, que explora o método funcionalista.[24]
Uma linha de trabalho característica de Florestan nos anos 50 foi o estudo das perspectivas teórico-metodológicas da sociologia.[25] Seus ensaios mais importantes acerca da fundamentação da sociologia como ciência foram, posteriormente, reunidos no livro "Fundamentos empíricos da explicação sociológica".[26][27] Seu comprometimento intelectual com o desenvolvimento da ciência no Brasil, entendido como requisito básico para a inserção do país na civilização moderna, científica e tecnológica, situa sua atuação na Campanha de Defesa da Escola Pública, em prol do ensino público, laico e gratuito enquanto direito fundamental do cidadão do mundo moderno.[3]
No ano de 1960, juntamente com outros intelectuais brasileiros, participa da criação da União Cultural Brasil-União Soviética, atual União Cultural pela Amizade dos Povos.[28][29]
Carreira[editar | editar código-fonte]
Durante o período de 1954 e 1964, foi regente da cátedra, livre docente e professor titular na cadeira de Sociologia, substituindo o sociólogo e professor francês Roger Bastide em caráter interino até 1964, ano em que se efetivou na cátedra, com a tese "A integração do negro na sociedade de classes".[30][31] Como o título da obra permite entrever, o período caracteriza-se pelo estudo da inserção da sociedade nacional na civilização moderna, em um programa de pesquisa voltado para o desenvolvimento de uma sociologia brasileira.[3]
Nesse âmbito, orientou dezenas de dissertações e teses acerca dos processos de industrialização e mudança social no país e teorizou os dilemas do subdesenvolvimento capitalista.[26][32] Inicialmente no bojo dos debates em torno das reformas de base e, posteriormente, após o golpe de Estado, nos termos da reforma universitária coordenada pelos militares, produziu diagnósticos substanciais sobre a situação educacional e a questão da universidade pública, identificando os obstáculos históricos e sociais ao desenvolvimento da ciência e da cultura na sociedade brasileira inserida na periferia do capitalismo monopolista.[3]
Aposentado compulsoriamente pela ditadura militar em 1969, foi Visiting Scholar na Universidade de Columbia, professor titular na Universidade de Toronto e Visiting Professor na Universidade de Yale e, a partir de 1978, professor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).[33][34][35]
No ano de 1975, veio a público a obra A revolução burguesa no Brasil, que renova radicalmente concepções tradicionais e contemporâneas da burguesia e do desenvolvimento do capitalismo no país, em uma análise tecida com diferentes perspectivas teóricas da sociologia, que faz dialogar problemas formulados em tom Max Weber com interpretações alinhadas à dialética marxista.[17][26] No inicio de 1979, retornou a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, agora reformada, para um curso de férias sobre a experiência socialista em Cuba, a convite dos estudantes do Centro Acadêmico de Ciências Sociais.[36]
Em suas análises sobre o socialismo, apropriou-se de variadas perspectivas do marxismo clássico e moderno, forjando uma concepção teórico-prática que se diferencia a um só tempo do dogmatismo teórico e da prática de concessões da esquerda.[37] Tendo colaborado com a Folha de S.Paulo desde a década de 1940, passou, em junho de 1989, a ter uma coluna semanal nesse jornal até o ano de 1995.[38]
Política[editar | editar código-fonte]
Foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT), juntamente com outros intelectuais como Sérgio Buarque de Holanda, Mário Pedrosa e de Apolônio de Carvalho.[39][40]
No ano de 1986, foi eleito deputado constituinte pelo Partido dos Trabalhadores (PT), tendo atuação destacada em discussões nos debates sobre a educação pública e gratuita.[17][41] Em 1990, foi reeleito para a Câmara.[42]
Desempenho eleitoral[editar | editar código-fonte]
Ano | Cargo | Partido | Votos | Resultado | Ref. |
---|---|---|---|---|---|
1986 | Deputado federal de São Paulo | PT | 50 024 | Eleito | [43] |
1990 | Deputado federal de São Paulo | 27 676 | Eleito |
Vida pessoal[editar | editar código-fonte]
Foi casado com Myriam Rodrigues Fernandes, de 1944 até a morte de Florestan no ano de 1995.[44][45] O casal teve seis filhos, Heloisa, Noêmia, Beatriz, Silvia, Miriam Lúcia e Florestan Júnior.[44][46]
Morte[editar | editar código-fonte]
Florestan, com graves problemas no fígado, em 1995, submeteu-se a um transplante de fígado mal sucedido no Hospital das Clínicas de São Paulo, realizado pelo professor Silvano Raia. Porém morreu de problemas em uma diálise devido a falha humana.[47]
Legado[editar | editar código-fonte]
O nome de Florestan Fernandes está obrigatoriamente associado à pesquisa sociológica no Brasil e na América Latina. Sociólogo e professor universitário, com mais de cinquenta obras publicadas, ele transformou o pensamento social no país e estabeleceu um novo estilo de investigação sociológica, marcado pelo rigor analítico e crítico, e um novo padrão de atuação intelectual.[48]
O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que foi orientado em seus trabalhos acadêmicos por Florestan, estabeleceu com ele forte relação afetiva, mantida até a morte do sociólogo.[26][49]
A biblioteca da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo recebeu o nome de Biblioteca Florestan Fernandes.[50]
O teatro do campus-sede da Universidade Federal de São Carlos leva o nome de Florestan Fernandes, e a biblioteca situada em frente a ele possui, em seu último andar, o acervo de livros que Florestan deixou em sua residência.[51] Este acervo conta com clássicos da literatura mundial, obras fundamentais da sociologia, filosofia, política e antropologia, bem como diversos livros da produção literária e científica latino-americana. Parte do acervo está disponível para empréstimo.[52]
Bibliografia selecionada[editar | editar código-fonte]
- Organização social dos Tupinambá, São Paulo, Instituto progresso, 1949.[53]
- A função social da guerra na sociedade Tupinambá, 1951.[54]
- A etnologia e a sociologia no Brasil, Editora Anhambi, 1958 (resenhas e questionamentos sobre a produção das Ciências Sociais no Brasil, até os anos 50);[55]
- Fundamentos empíricos da explicação sociológica, Cia. ed. nacional, 1959.[56]
- Mudanças sociais no Brasil, Difusão Européia do Livro, 1960 (nesta obra Florestan faz um panorama de seu trabalho e retrata o Brasil);[57]
- Folclore e mudança social na cidade de São Paulo, Petrópolis, Editora Vozes,1961.[58] (esta obra reúne trabalhos e pesquisas realizadas nos anos em que Florestan foi aluno de Roger Bastide na USP, dedicados a várias manifestações de cultura popular entre crianças da cidade de São Paulo).
- A integração do negro na sociedade de classes, Dôminus Editora, 1965.[59] (estudo das relações raciais no Brasil);
- Sociedade de classes e subdesenvolvimento, Rio de Janeiro, Editora Zahar. 1968.[60]
- Capitalismo dependente e Classes Sociais na América Latina, Rio de Janeiro, Editora Zahar, 1973.[61]
- A investigação etnológica no Brasil e outros ensaios, Petrópolis, Vozes, 1975.[62] (reedição em volume de artigos anteriormente publicados em revisas científicas e dedicados à produção recente da antropologia brasileira);
- A revolução burguesa no Brasil: Ensaio de Interpretação Sociológica, Rio de Janeiro, Zahar, 1975.[63]
- Da Guerrilha ao Socialismo: A Revolução Cubana, TAQ, 1979.[64]
- O que é Revolução, São Paulo, Brasiliense, 1981.[65]
- Poder e Contrapoder na América Latina, Zahar, 1981.[66]
- Nós e o Marxismo, São Paulo, Expressão Popular, 2009.[67]
- Apontamentos sobre a "teoria do autoritarismo, São Paulo, Expressão Popular, 2019.[68]
- Reflexões sobre a construção de um instrumento político: contribuição ao I Congresso do Partido dos Trabalhadores, São Paulo, Expressão Popular, 2019.[69]
Ver também[editar | editar código-fonte]
- Darcy Ribeiro
- Gilberto Freyre
- Fernando de Azevedo
- Octavio Ianni
- Movimento negro no Brasil
- Educação no Brasil
- Mudança social
- Karl Mannheim
- Florestan Fernandes Júnior
- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
- Partido dos Trabalhadores
Referências
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- ↑ «Premiados do Ano | 62º Prêmio Jabuti». Prêmio Jabuti. Consultado em 31 de agosto de 2020
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Bibliografia[editar | editar código-fonte]
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Ligações externas[editar | editar código-fonte]
- «Florestan Fernandes, um militante do ensino democrático, Nova Escola, 2016»
- «A revolução burguesa no Brasil»
- «A ciência aplicada e a educação como fatores de mudança cultural provocada, Florestan Fernandes»
- «A sociologia de Florestan Fernandes, Octávio Ianni» (PDF)
- «Florestan Fernandes e criação de uma problemática, Miriam Limoeiro» (PDF)
- «Marxismo e "imagem do Brasil" em Florestan Fernandes por Carlos Nelson Coutinho, 2000, Site Gramsci e o Brasil»
- «Arquivo pessoal de Florestan Fernandes»
- Obras disponíveis na Biblioteca Digital Curt Nimuendajú
- Nascidos em 1920
- Mortos em 1995
- Naturais da cidade de São Paulo
- Alunos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
- Comunistas do Brasil
- Deputados federais do Brasil por São Paulo
- Escritores de São Paulo (estado)
- Sociólogos de São Paulo
- Marxistas do Brasil
- Membros do Partido dos Trabalhadores
- Professores de São Paulo (estado)
- Professores da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
- Professores da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
- Doutores honoris causa da Universidade Federal do Ceará
- Exilados na ditadura militar no Brasil (1964–1985)
- Opositores da ditadura militar no Brasil (1964–1985)
- Homens ganhadores do Prêmio Jabuti
- Folcloristas do Brasil